Tuesday, January 16, 2007

Quando você for ao banheiro, durante o intervalo, cuidado: pode haver uma câmera.


Começou o Big Brother Brasil. Aquele período de três meses em que você deixa de ter vida própria. Deixa de cozinhar para ver os outros cozinharem. Deixa de tomar banho para ver os outros tomarem. Deixa de transar com sua esposa para ver os outros transarem (não com a sua esposa, obviamente). Você deixa de ler um bom livro para ver pessoas falando errado, fofocando, malhando. Você simplesmente pára o que está fazendo e fica ali, estático, completamente passivo diante do Grande Irmão, como havia previsto George Orwell, no livro “1984”. Você obedece às ordens dele: “espie”, “vote”, “ligue”, "assista", “compre”. Você não troca mais carícias nem palavras com sua mulher. Ela também não quer saber de você, pois prefere ver o marombado-anabolizado-acéfalo de sunga na piscina. Você tenta fazer cafuné nela e ela, delicadamente, pede para você tirar a mão e alcançar o controle remoto. Quer que você aumente o volume, não consegue ouvir o que as cobras estão tramando. Seu filho vem declamar o poema que ele apresentará amanhã na escola e você faz “Psiu!”. Parabéns, você acaba de estragar o moleque, com certeza ele carregará este trauma para o resto da vida. Depois não reclame se ele tiver pânico de falar em público. A culpa é toda sua. Sua e do Bial. Com a TV ligada na Globo, você nem sequer ouve o seu grande irmão de verdade - aquele, de sangue mesmo, filho da sua mãe e do seu pai - dizer que engravidou a empregada e que queria ouvir a sua opinião, se pagava pra ela fazer um aborto ou não. É, o drama não tá só na TV, tá na vida real também. Você vê o seu filho esquecer o trecho do poema de Camões para repetir até dizer chega o bordão “Ninguém merece”, uma gíria dita por algum participante idiota e que, com certeza, será utilizada em novelas, na propaganda e entrará para o dicionário Aurélio. Ainda não satisfeito com os flashes mostrados na TV aberta, você assina o canal pago com conteúdo exclusivo e câmeras escondidas até dentro do vaso sanitário. Talvez esta câmera flagre algo de melhor conteúdo do que aquilo que sai das cabeças dos nossos ilustres participantes. É, antes que o programa acabe, o seu relacionamento entra em crise e sua mulher o coloca no paredão. Será que você fica ou sai da casa? Da sua própria casa? Neste jogo, você pode acabar dançando - e não será aquela nova coreografia de funk, que o casal de participantes mais engraçadinhos inventou. A ironia é que parece que quem está preso e confinado dentro de uma casa são eles, os participantes. Mas não. É você. E eles até podem ganhar o prêmio de um milhão, mas você não. Vai continuar nesta vidinha de merda, com sua esposa chata - e que, cá entre nós, nunca posará para a Playboy -, sua casa sem piscina e aquele salário que não vale nem uma estaleca.

0 Comments:

Post a Comment

<< Home