Sunday, April 01, 2007

Despedida*

Já fazia um bom tempo que eu estava infeliz com tudo aquilo. Mas cada hora inventava um motivo para evitar a resolução mais óbvia. Todo mundo sabia o que deveria ser feito, inclusive eu mesmo. Mas não, era cômodo demais ficar naquela situação, naquela areia movediça em que eu já estava afundado até a cabeça.
Mas daí veio a gota d´água. Aquele empurrãozinho que faltava para eu tomar uma atitude. Uma atitude de homem, de adulto. Era hora de sair da casa dos meus pais. Afinal, já estava com trinta anos contados, tendo tudo do bom e do melhor, e, cá entre nós, já estava mais do que na hora de criar vergonha na cara, barbada e mal lavada. Bom, tomei coragem e o fiz. “Bênção, pai, bênção, mãe, estou indo, é para o meu bem, sei que vocês vão sentir minha falta, mas é preciso cortar o cordão umbilical e blá, blá, blá.” Minha mãe mal pôde conter as lágrimas e o soluço, que parecia querer abafar, mantendo os lábios juntos e apertados. Meu pai, que havia abaixado o jornal e prestava atenção enquanto eu falava, voltou o jornal à posição original, pigarreou e deixou o silêncio falar mais alto, como se nada tivesse acontecido. Dei as costas para os velhos, ainda ouvi minha mãe balbuciar algumas palavras, trêmulas de tanta emoção, e segui em frente o meu caminho, caminho que não sei para onde me levaria, mas que eu deixaria me levar fosse para onde fosse, mesmo que para o fundo do poço.

* Texto escrito em 17/11/06.

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